domingo, 8 de agosto de 2010

há no meu ombro lugar para o teu cansaço



















































Não caibo nesta tarde que me desfolhas
sobre o coração. Renovam-se-me sob os passos
todos os caminhos e o dia é uma página que, lida
e soletrada, descubro inatingível como o vento, a rua e
a vida.
As mesmas mãos que antes desfraldavam
domésticas insígnias abaixo dos beirais
emprestam novos pássaros às árvores.
Pétala a pétala chego à corola desta minha hora.
Roubo o meu ser a qualquer outro tempo,
não há em mim memória de alguma morte,
em nenhum outro lugar me edifiquei.
Arredondas à minha volta os lábios para me dizer,
recuo de repente àquele princípio que em tua boca tive.
Eu sei que só tu sabes o meu nome
- tentar sabê-lo foi afinal o único
esforço importante da minha vida.
Sinto-me olhado e não tenho mais ser
que ser visto por ti. Há no meu ombro lugar
para o teu cansaço e a minha altura é para ser medida
palmo a palmo pela tua mão ferida.






Ruy Belo












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