terça-feira, 27 de abril de 2010

passar um sonho pelo rosto



































imagem, algures daqui









 



Pois lhe digo, minha Dona. É uma pena a senhora andar por aí fatigando seus olhos pelo mundo. Devia era, logo de manhã, passar um sonho pelo rosto. É isso que impede o tempo e atrasa a ruga. Sabe o que se faz? Estende-se aí na areia, oblonga-se deitadinha, estica a alma na diagonal. Depois, fica assim, caladita, rentinha ao chão, até sentir a terra se enamorar de si. Digo-lhe, Dona: quando ficamos calados, igual a uma pedra, acabamos por escutar os sotaques da terra. A senhora num certo momento, há-de ouvir um chão marinho, faz conta é um mar sob a pele do chão. Aproveita esse embalo, Dona Luarmina.Eu tiro vantagens desses silêncios submarinos. São eles que me fazem adormecer ainda hoje. Sou criança dele, do mar















mia couto, mar me quer
















2 comentários:

  1. Excelente trecho de Mia Couto. O silêncio para ouvir o mundo e o Sonho no rosto para esbater o tempo....muito bonito!

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  2. bonito, e na minha opinião, musical, quase se ouve o barulho do mar e sente-se o morno da areia enquanto se estica a alma na diagonal...

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