terça-feira, 18 de maio de 2010

...sabendo desde sempre que não vens e mesmo assim...
































é claro que sei dizer palavras calmas
e amar devagar os que chegam a meu lado
e recordam o meu nome de todas as maneiras
com que ao redor da vida o foram construindo

é claro que sei inventar cantigas breves
das que à meia-noite perdem as notas mais vibrantes
quando fogem precipitadamente dos nossos bolsos

é claro que sei voltar a casa e abrir a porta
e fingir que tudo está perfeito sobre a mesa
e os objectos guardam os lugares de sempre
e eu continuo na moldura com um riso de quinze anos
tropeçando no teu ar sério quase a sair do retrato

é claro que sei passar os dedos devagar pelo teu corpo
nas noites em que chegas e dizes já não chove
como se colocasses no meu colo uma prenda de natal
e pudesses apagar a tempestade
no brevíssimo instante em que a vida se resume
aos nossos olhos tentando
acreditar que é cedo

é claro que sei esperar por ti
sabendo desde sempre que não vens e mesmo assim
escolho sem sobressalto a música perfeita
de te acolher no sono com o enevoado rumor
de todos os encontros improváveis

é claro que sei as palavras mesmo que as não diga
que misturas ao longe com os afiados gumes
com que tentas a custo perdoar-te
as horas roubadas a todos os seus legítimos donos

é claro que sei fechar as janelas às armadilhas
que as noites constroem dentro dos teus medos
e donde não consegues regressar
e com sorte encontrar numa cómoda
qualquer coisa tua que esqueceste
na pressa da saída e pensar
que foi por mim que ela apareceu
em tão estranho lugar

- mas quando entre os ruídos da noite
a tua ausência é a única divisão da casa
que razoavelmente partilhamos
tudo isso serve desculpa de muito pouco







Alice Vieira













3 comentários:

  1. Quem és tu,
    promessa imaginária que me ensina
    a decifrar as intenções do vento,
    a música da chuva nas janelas
    sob o frio de fevereiro?


    "Esta noite morri muitas vezes, à espera
    de um sonho que viesse de repente
    e às escuras dançasse com a minha alma
    enquanto fosses tu a conduzir
    o seu ritmo assombrado nas trevas do corpo,
    toda a espiral das horas que se erguessem
    no poço dos sentidos. Quem és tu,
    promessa imaginária que me ensina
    a decifrar as intenções do vento,
    a música da chuva nas janelas
    sob o frio de fevereiro? O amor
    ofereceu-me o teu rosto absoluto,
    projectou os teus olhos no meu céu
    e segreda-me agora uma palavra:
    o teu nome - essa última fala da última
    estrela quase a morrer
    pouco a pouco embebida no meu próprio sangue
    e o meu sangue à procura do teu coração."

    Fernando Pinto do Amaral

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  2. bom dia, vês como acordo com poemas?, os olhos ainda mal conseguem ler, lágrimas ainda de sono.

    até logo

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  3. Podia-te acordar com canções. Embora não tenha keito nenhum adoro cantar

    http://www.youtube.com/watch?v=cIuS_lzb5b8

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