Espera-me e eu voltarei,
mas espera-me muito.
Espera-me quando cair a neve
e chegarem as chuvas tristes,
quando chegar o calor,
não deixes de esperar.
Espera-me, quando já
ninguém esperar e se tiver
esquecido já o ontem.
Espera-me mesmo que as cartas
não cheguem de longe.
Espera-me quando todos
estiverem já fartos de esperar.
Espera-me e eu voltarei,
não ames – peço-te –
quem repetir de memória
que é tempo já de olvidar;
mesmo que mãe e filho julguem
que eu não existo mais.
Deixa que os amigos, ao lume,
se cansem de esperar e bebam
vinho amargo em memória de mim.
Espera-me e não
te apresses a beber com eles.
Espera-me e eu voltarei,
para que a morte se encha de raiva.
O que nunca me esquecer
dirá talvez de mim: coitado, teve sorte.
Jamais compreenderão
aqueles que jamais esperaram.
Tu é que me salvaste do fogo.
De como sobrevivi
saberemos tu e eu,
porque simplesmente me esperaste,
como ninguém me esperou.
Konstantin Simonov
"já não te aguardo,
ResponderEliminaradio-me"
valter hugo mãe
"Hoje aviso-te
que ficarei para sempre
arquejando no teu corpo,
na orla infinita da tua mão,
no teu ombro, que é uma espada.
Na tua língua, que é a minha.
Só o teu coração saberá
se é
promessa ou ameaça,
mas ficarei para sempre
e basta.
E entre os dois – estranhamente -
termina o absurdo território do poder.
Aproximas-te:
água-deserto-mel,
e estendo-me
mel-deserto-água.
Não sei onde começas,
onde começo...
como a dança do golfinho no oceano."
Lourdes Espínola
todos os pássaros sossegaram
ResponderEliminaras crianças desceram das árvores e guardaram os jogos
nas algibeiras
recolheram a casa vagarosamente
- é noite
- a cidade pendurou ao pescoço seus filamentos de néon
ouvem-se motores
vozes longínquas esparsas na neblina
as nuvens ainda fiam a ténue luminosidade do crepús-
culo
(...)
- corremos
- em cada voz sussurrada acorda um objecto cortante
uma faca de luz um fogo capaz de exterminar
e no asfalto reabre-se uma ferida
arrasta-se um sapato muito devagar
- é noite dolorosamente noite
nos ossos guardamos a essência do voo e na pele a soli-
dão de muitos caminhos
uma estrada mais nítida tatuou-se-nos na memória
- incrustaram-se nas pálpebras da noite brancas imagens
de insónia
reparem
nestas folhas de papel atiradas ao vento
estes rostos carcomidos pela humidade do desejo
estes túneis-labirintos de espelhos
esta fuga sempre recomeçada pelos alicerces calcários da
cidade
Al Berto