se eu fosse louco não era um tonto parvo, que fico imóvel
perante uma adversidade. se eu fosse louco esquecia que há gente e sociedade e
convenções e essas tretas todas e saía já deste emprego estúpido e ia ter
contigo. e não me importava nada com quem visse ou estivesse ou comentasse.
punha-me a caminho e quando aí chegasse olhava-te, sorria, pousava uma mão em
cada uma das tuas faces e beijava-te e beijava-te e beijava-te e o tempo parava
e deixava de contar. e sendo louco queria estar despido de tudo o que queria
deixar para trás quando te fosse beijar, chegar a ti como um animal, irracional
mas puro. se não fosse apenas tonto tirava mesmo a roupa, o casaco logo à
entrada, a camisa a subir as escadas, virava à esquerda, desapertava o cinto,
livrava-me das calças, virava à direita, tirava o resto e quando chegasse a ti
para te beijar estava nu. depois não existia mais nada, apenas nós os dois, e
eu só queria saber do teu sabor, da tua boca molhada, desses lábios que queria
mordiscar, da tua língua na minha, das palavras que não precisávamos de dizer e
desses nossos beijos de mo ra dos em que sabíamos haver um todo maior que as
partes, que num beijo assim se salva o mundo, que entre duas bocas há um abismo
mas também um evereste e que não éramos loucos, loucos seríamos se não o
fizéssemos.
josé luis almeida
Já me trocaste por outro
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