quinta-feira, 13 de maio de 2010

Não adormeças:




















(imagem apanhada não sei onde de lylia corneli)










 








Não adormeças: o vento ainda no meu quarto
e a luz é fraca e treme e eu tenho medo
das sombras que desfilam pelas paredes como fantasmas
da casa e de tudo aquilo com que sonhes.



Não adormeças já. Diz-me outra vez do rio que palpitava
no coração da aldeia onde nasceste, da roupa que vinha
a cheirar a sonho e a musgo e ao trevo que nunca foi
de quatro folhas; e das ervas mais húmidas e chãs
com que em casa se cozinhavam perfumes que ainda hoje
te mordem os gestos e as palavras.



O meu corpo gela à míngua dos teus dedos, o sol vai
demorar-se a regressar. Há tempo para uma história
que eu não saiba e eu juro que, se não adormeceres
serei tão leve que não hei-de pesar-te nunca na memória,
como na minha pesará para sempre a pedra do teu rosto
se agora apenas me olhares de longe e adormeceres.






Maria do Rosário Pedreira














1 comentário:

  1. Conto-te outra ez do rio, só que não era o rio, era um ribeiro que secava sempre no verão, a roupa cheirava mesmo a musgo (e alguma a sonho) porque era secada ao sol, em cima das ervas... e falo-te de novo do eterno, desta vez num poema não transformado em prosa :)
    Vasco (teu)

    "Guarda-me adormecida para sempre no teu peito
    ou deixa-me voar uma vez mais
    sobre esta terra de ninguém
    onde morro por qualquer coisa que me fale de ti.
    Há noites assim em que o silêncio se transforma
    ao de leve numa lâmina que minuciosamente
    rasga o linho onde ficou esquecido
    o corpo que habitamos
    em provisórias madrugadas felizes...
    Depois é só abrir os braços e acreditar
    que ainda faltam muitas horas para a partida
    e que à-toa pelos corredores ainda escorre
    uma razão primeira a trazer-me de volta.
    E eu adormecida para sempre no teu peito.
    E eu acorrentada para sempre no teu peito.
    E de novo entre nós aquele choro de quem
    não teve tempo de preparar a despedida
    com as palavras certas;
    porque as palavras certas
    estavam todas em histórias erradas
    que outros escreveram em lugares nublados
    que nem vale a pena tentar recompor.
    Muito ao longe uma voz desgarrada
    estabelece o fim do verão...
    E eu adormecida para sempre no teu peito
    e eu acorrentada para sempre no teu peito..."

    Alice Vieira

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